Música como interdisciplina: Perspectivas e intersecções na Universidade de Coimbra
A Música e domínios adjacentes ocupam um lugar de destaque na investigação que vem sendo desenvolvida no universo da Universidade de Coimbra. As questões colocadas pelo fenómeno musical não só beneficiam de abordagens interdisciplinares, como verdadeiramente convocam um cruzamento de perspectivas, metodologias e campos de conhecimento díspares mas complementares. Neste contexto, torna-se crucial fomentar o contacto entre investigadores, a partilha de projetos e interesses, criando-se oportunidades para colaborações e para o desenvolvimento de uma comunidade académica mais coesa. É com este objetivo que um grupo de investigadores do CEIS20 organiza este evento, assim divulgando o trabalho que vem sendo realizado e promovendo as suas intersecções.
Data: 15 de Fevereiro de 2024
Local: CEIS20 - Centro de Estudos Interdisciplinares, Rua Filipe Simões nº 33, Coimbra
Programa
10:00 – 11:00
Cognição e psicologia da música – Tempo e emoção
Joana Sayal
Pedro Torres Palhares
Alexandre Sayal
Lígia Borges Silva
11:00 – 11:30
Coffee break
11:30 – 12:30
Conceptualização, criatividade e tecnologia
Thales Roel Pacobahyba Pessanha
Pedro Augusto
OCH
Nuno Trocado
14:00 – 15:00
História, paradigmas e identidade
André Granjo
Nils Meisel
Catarina Cota
Inês Mariano
15:00 – 15:30
Coffee break
15:30 – 17:00
Mesa Redonda – Perspectivas e futuros da investigação em música
Pedro Martins
Renato Panda
Óscar Gonçalves
Jônatas Manzolli
José Oliveira Martins
Leonor Losa (moderação)
Joana Sayal
Auditory Neuronal Entrainment of Consciousness
A consciência envolve um fluxo de informação neuronal fortemente associado à sincronização oscilatória no cérebro. O alinhamento entre os ritmos ambientais e as oscilações cerebrais é conhecido como entrainment neuronal e poderá desempenhar um papel nos estados de consciência. Quando ocorre em resposta a estímulos auditivos, é designado entrainment neural auditivo - as ondas cerebrais estão sincronizadas com as ondas sonoras. Com base em investigação prévia sobre os efeitos da música em pacientes com perturbações da consciência, utilizaremos técnicas como eletroencefalografia e estimulação auditiva (batimentos binaurais) para caracterizar e modular estados de consciência (atenção focada e divagação mental) através da estimulação baseada em entrainment auditivo. Adicionalmente, iremos investigar a influência da formação musical nesta categoria de entrainment, comparando resultados entre músicos e não músicos. Compreender o fenómeno de entrainment neuronal com estimulação auditiva em diversos estados de consciência poderá ser um contributo para o desenvolvimento das estratégicas de reabilitação em perturbações da consciência, como o coma, estado vegetativo e o estado mínimo de consciência.
Joana Sayal é bolseira de doutoramento em Psicologia (Neurociência Cognitiva) no Proaction Lab e investiga temas como as neurociências da consciência, música e neuroplasticidade. Completou em 2022 o Mestrado Interuniversitário em Neuropsicologia Clínica e Experimental pelas Universidades de Lisboa, Coimbra e Minho, com estágio curricular na Neurologia do CHUC e investigação para a tese de mestrado no Proaction Lab. É formada em violoncelo pelo conservatório de música, tocando em vários projetos musicais.
Pedro Torres Palhares
A neurophenomenological investigation of musical experiencing in jazz improvisation
Musical improvisation is often linked with profound changes in the quality and intensity of subjective experience, configuring, in many cases, altered states of consciousness such as absorption, trance or flow, while also fostering spontaneous thought phenomena like mind wandering or creative thought. Despite the phenomenological richness and complexity that characterizes acts of improvisation, no study has provided a detailed psycho-phenomenological account of improvisatory experience, how this experience shapes – and is shaped by – ongoing musical performance, or even how sociodemographic variables or musical training/expertise relate to the musician’s experiental profile(s) during improvisation. Aiming to address these questions, we laid out two studies, with Study 1 adopting a large-scale psycho-phenomenological approach, and Study 2 adopting a small-scale neurocognitive approach. These two ongoing projects will be the focus of my presentation at “Música na UC”, where I will, in a first moment centred on Study 1, discuss the possibility of studying, from a psycho-phenomenological standpoint, the structure and configuration of consciousness during acts of musical improvisation by means of experience sampling mid-performance. I will then show how this experimental paradigm can be (and has been) used to assess the impact musical experience on musical performance itself. Finally, bringing focus to Study 2, I will present a proposal for studying the brain processes that underlie music cognition, performance, and creativity from a novel approach, one consisting in the combination of transcranial magnetic stimulation with electroencephalography (TMS-EEG).
I am doing a PhD in Cognitive Neuroscience as a member of the Proaction Lab, and my work aims to investigate the structure and configuration of consciousness during musical performance. I privilege the characterization and explanation of the mechanisms that constitute and lead to certain states of consciousness, namely mind-wandering and creative thought. Methodologically, I use psycho-phenomenological approaches (via experience sampling) and deterministic brain activity measures (by combining transcranial magnetic stimulation with electroencephalography [TMS-EEG]) during acts of musical improvisation.
Alexandre Sayal
Ouve o teu cérebro: descodificação de emoções evocadas pela música para desenvolvimento de interfaces de neurofeedback com base em fMRI
A música pode transmitir-nos emoções básicas, como a felicidade e tristeza, e emoções mais complexas, como a ternura ou a tristeza. Os seus efeitos na regulação emocional têm atraído a atenção da neurociência cognitiva, no sentido de compreender os mecanismos neurais subjacentes às emoções evocadas pela música. Aqui apresentamos três trabalhos em desenvolvimento. O primeiro trabalho foca-se na relação entre a classificação de trechos musicais de acordo com estados afetivos e os seus correlatos neurais. Adquirimos dados de IRMf em 20 participantes enquanto ouviam trechos musicais classificados a priori nos quatro quadrantes do modelo valência-arousal. Caracterizámos os correlatos neurais em valência (positiva, negativa) e arousal (alto, baixo) e os resultados destacam sub-regiões específicas da música do córtex auditivo, tálamo, hipocampo e cerebelo. Depois, criámos um modelo computacional que descodifica o quadrante correspondente à música com elevada acurácia, bem acima de um rigoroso nível de acaso. O segundo trabalho utiliza trechos musicais que os participantes já conhecem e associam a uma de nove emoções: maravilha, transcendência, ternura, nostalgia, paz, poder, ativação feliz, tensão, tristeza. A hipótese centra-se no maior efeito destas músicas e na optimização do protocolo experimental, com bons resultados preliminares. Por fim, o terceiro trabalho desenvolve uma interface de neurofeedback baseada em música para ser utilizada em IRMf. O objetivo é criar uma experiência mais imersiva e recompensante no processo de conectar o participante e a sua própria ativação neural durante uma tarefa. Esta abordagem pode revelar-se importante no desenvolvimento de futuras intervenções em patologias associadas à regulação emocional.
Alexandre Sayal concluiu o Mestrado em Engenharia Biomédica em 2016 na Universidade de Coimbra. Investiga na área da neurociência cognitiva, com particular interesse em ressonância magnética funcional. Após três anos, inscreve-se no doutoramento em Engenharia Biomédica com o projeto "Ouve o teu cérebro: a música como interface para intervenções de neurofeedback com base em fMRI", que resulta da combinação da sua paixão pela música com a vontade de um engenheiro de compreender a estrutura biológica mais complexa - o cérebro humano.
Lígia Borges Silva
Música e percepção temporal - O papel de diversos parâmetros musicais na percepção de passagem do tempo durante a audição de música
A audição de música pode influenciar a percepção temporal do ouvinte. Desta forma, dois excertos musicais com a mesma duração cronométrica podem causar a sensação de diferentes durações, ou de uma velocidade mais rápida ou mais lenta da passagem do tempo. Estudos empíricos apontam para três tipos de fatores responsáveis por este fenómeno: musicais, individuais e contextuais. Nesta apresentação será descrito o trabalho realizado dentro desta temática, no âmbito de um projeto de tese inserido no curso de Doutoramento em Estudos Artísticos da FLUC. Começar-se-á por abordar a fase experimental deste projeto, descrevendo as dificuldades metodológicas reportadas na literatura e as soluções encontradas e aqui aplicadas. De seguida serão descritos os resultados obtidos, tendo em conta os fatores musicais abordados (andamento, métrica, timbre, tonalidade e regularidade rítmica). Serão expostos os passos futuros previstos no projeto, nomeadamente uma fase dedicada à análise musical na qual se prevê a aplicação dos conhecimentos obtidos na fase experimental. Por fim, e relevante para este dia de discussão, a investigadora partilhará perspectivas futuras de desenvolvimento do projeto que poderão beneficiar de uma abordagem interdisciplinar, envolvendo conhecimentos e/ou metodologias provenientes de áreas como as neurociências, a programação ou a análise musical.
Lígia Borges Silva é doutoranda no curso de Estudos Artísticos da UC, onde estuda as relações entre o tempo musical e o tempo subjetivo. O seu percurso académico é pautado por uma formação estilisticamente variada dentro da música, que se materializou na conclusão de uma licenciatura em flauta transversal no âmbito da música clássica, uma licenciatura em saxofone jazz, e um mestrado em ensino da Música. Participou como instrumentista em variadas formações musicais, desde ensembles de música de câmara a orquestras sinfónicas, combos e Jazz Big Bands. Após anos dedicados à performance musical e ao ensino vocacional de música atualmente dedica-se exclusivamente à investigação sendo bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia.
Thales Roel Pacobahyba Pessanha
Uma plataforma multimodal de interação humano-computador para música e performance interativas
O avanço das tecnologias de mídia digital na criação e execução musical tem proporcionado novas possibilidades para expressão criativa e envolvimento do público. A pesquisa em design de mídia computacional contribuiu para o desenvolvimento de ferramentas sofisticadas, permitindo a integração de diversas formas de mídia e interação inovadora com o público. Contudo, a concepção desses sistemas requer uma compreensão aprofundada dos gestos musicais e sua relação com som, movimento e significado. Observa-se, nas últimas décadas, uma tendência crescente na comunidade de interação humano-computador para desenvolver sistemas capazes de detectar e interpretar uma gama mais ampla de expressões humanas.
Nesse contexto, o projeto proposto busca aproveitar o potencial do design de mídia computacional para criar uma experiência de performance mais integrada e interativa. Isso será alcançado por meio do desenvolvimento de uma plataforma de interação humano-computador baseada na web, permitindo a integração de movimento, som, sensores e instrumentos musicais digitais em todo o ambiente da internet. Além disso, o projeto visa criar uma experiência sonora mais envolvente e participativa, oferecendo insights e recomendações para o desenvolvimento de plataformas eficazes de interação humano-computador. O processo estruturado e iterativo proposto visa projetar e desenvolver contextos sonoros que possam ser utilizados em diversas circunstâncias e por pessoas de diferentes origens culturais.
Thales Roel é engenheiro de som e pesquisador no Laboratório de Design Computacional e Visualização. Formou-se em Música com ênfase em composição pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), obtendo também certificação em Engenharia de Som. Atualmente, cursa doutorado em Design de Médias Computacionais na Universidade de Coimbra, focando em estratégias de design sonoro que facilitam interações entre humanos e máquinas. Seu trabalho é orientado pelos Professores Doutores Pedro Martins e Jônatas Manzolli.
Pedro Augusto
Ruído Branco
Ruído e Terapia. O ruído é um aspecto material do som, podendo ser usado para descrever uma série de situações aurais. Por isso é relacional, é subjectiva. A quantificação mais possível de ruído é aquela gerada pelo "white noise".
Aqui, iremos demonstrar como a materialidade do ruído e, mais concretamente, o ruído branco pode conduzir a determinadas ilusões acústicas, catarses, indução de sono e alheamento do real. Da máquina sonora de Bernini à transcomunicação, o ruído é transversal a épocas e culturas, e olhado como forma terapêutica ou de força sobrenatural. Do som do mar ao "psithurism", do regime tecnosonoro desencadeado pela Revolução Industrial ao tratamento de tinnitus, esta massa sonora em certa medida, interage fisica e mentalmente com o humano. "Silence is not simply de absence of noise." (Corbin, 2018)
Pedro Augusto, desde 2021 é assistente convidado na FBAUP e, desde 2023, no IPCA. Trabalha como artista e compositor musical para as áreas da dança, teatro, performance e cinema. Tem largo percurso fonográfico como produtor, engenheiro de som e editor em diversos álbuns de música portuguesa da última década. É ainda responsável pelo arquivo Found Tapes Porto, pelo projecto musical Live Low e pelo selo editorial ETAK. Nos últimos anos tem dedicado o seu trabalho à curadoria artística e à edição literária dentro das temáticas da música móvel, serendipidade e caminhada. Membro do i2ADS.
OCH
Community.quantumland.art
Community.quantumland.art é um dos outputs em curso do projecto IIMPAQCT. No decorrer de um interesse crescente em computação quântica e práticas criativas, num panorama internacional, surge a necessidade de poder mapear e conectar esta comunidade emergente. Quais são os eventos, que trabalhos criativos e escritos estão a ser produzidos, quais tecnologias estão a ser usadas, quem são os intervenientes, e como se relacionam todos estes elementos? "Community." surge como uma plataforma online, desenvolvida em código aberto, para conectar, documentar, e estimular trabalho criativo e de investigação interdisciplinar em comunidade. Nesta breve apresentação farei um walkthrough das duas dimensões da plataforma - forum e database -, e fazendo também breve referência à filosofia de construção: online community digital garden.
OCH is a performer-composer-technologist working on music and quantum computing, telematics, multimedia, and improvisation. He is passionate about cinema, teaching, and performing new works. He earned his PhD at UC Irvine, with research project Adventures in Quantumland (quantumland.art), and his MA in Music Theory and Composition at ESMAE with research on the relations between music and painting. In recent years, his work has been recognized by MSCA, Fulbright, FCT, Medici, Beall Center for Art+Technology, and IBM. omarcostahamido.com
Nuno Trocado
Analogia na música e metáforas organicistas
A capacidade cognitiva de recurso à analogia é central para um amplo espectro de habilidades humanas, ubíqua no pensamento quotidiano e determinante para a experiência mundanal. Na música, a analogia está fundamentalmente implicada na cognição de padrões sónicos e no mapeamento de processos gesturais-temporais; e, mais genericamente, nas múltiplas formas como pensamos, sentimos e nos movemos na e através da música, individual e colectivamente. Uma das analogias mais disseminadas na teoria e estética musicais é a do organicismo: a perspectiva de que a música é animada de uma força vital também presente na natureza, articulando os componentes de uma obra musical como uma unidade singular, em crescimento autónomo a partir de uma semente germinal, de forma análoga aos organismos vivos. A minha investigação abrange três compreensões organicistas de largo escopo, a saber, as suas motivações programáticas, estruturais e ecológicas, desde o séc. xix até ao presente. Nela procuro ainda ressonâncias com a minha prática artística.
Nuno Trocado (Univ. Coimbra, CEIS20, FLUC) é doutorando em Estudos Artísticos e bolseiro da FCT. É ainda licenciado em Música / Jazz e mestre em Composição e Teoria Musical, ambos os graus pela ESMAE. Como músico, participa em grupos de improvisadores e compõe para diversas formações instrumentais e electrónica, com especial interesse por cruzamentos disciplinares. nunotrocado.com
André Granjo
António Xavier Monteiro e a música orquestral na Academia de Coimbra em meados do séc. XIX
A prática musical orquestral na Academia de Coimbra é um fenómeno que pode ser traçado de forma directa desde os finais da primeira metade do séc. XIX até aos nossos dias, ligando a Orquestra do Teatro Académico, a Tuna Académica da Universidade de Coimbra e, recentemente, a Orquestra Académica da UC. Ao longo destes quase 200 anos de história, vários foram os protagonistas que corporizaram a esta actividade. Pretendemos focar a nossa atenção na figura do compositor António Xavier de Sousa Monteiro. Figura totalmente esquecida pela história da música no nosso país, Monteiro foi aluno da Universidade de Coimbra em meados do séc. XIX tendo colaborado de forma directa com a Orquestra do Teatro Académico. A produção musical que hoje lhe conhecemos divide-se entre obras instrumentais especificamente escritas para a Orquestra do Teatro Académico, algumas explicitamente ligadas a vivências académicas, e música de carácter religioso. Xavier Monteiro ficaria sobretudo conhecido pela sua actividade como Doutor de Direito Canónico e por ter sido Bispo de Beja. A sua produção musical, ainda que tendo obtido algum reconhecimento na época, permanece totalmente votada ao esquecimento. Os esforços da Orquestra Académica da UC em resgatar algumas das suas obras pretendem dar a conhecer este compositor em particular mas também as práticas musicais da Academia Coimbrã na segunda metade do séc. XIX, procurando assim enriquecer o conhecimento da história da música do nosso país.
Licenciado em Antropologia pela Universidade de Coimbra, aí frequentou o Mestrado e o Doutoramento em Ciências Musicais. Mestre em Direcção de Orquestra de Sopros pela Zuid-Nederlandse Hoogeschool fur Muziek em Maastricht e, entre 2009 e 2011 foi Visiting Scholar no departamento de Wind Music Studies da Universidade do Norte do Texas. É membro do Instituto de Etnomusicologia – Centro de Estudos de Música e Dança, maestro titular da Orquestra Académica da UC e Professor Assistente Convidado do DeCA-UA.
Nils Meisel
Pensamento sonoro e a filosofia da ambiência
A apresentação aborda a relação entre a arte sonora e a filosofia,
explorando as implicações conceptuais da arte sonora para além das
formas tradicionais de perceber e compreender o som. Argumenta que o
legado do som na arte ocidental foi definido principalmente através de
estruturas musicais logocêntricas dentro de uma ontologia visual,
limitando a compreensão de qualidades sonoras distintas.
O surgimento da "sound art" nas últimas décadas provoca uma
dissonância nesta narrativa, questionando paradigmas musicais
tradicionais e abrindo espaço crítico importante, através da
experimentação com som, espaço e ambiente. A atenção ao som como meio
artístico revela modos alternativos de pensar e interagir com domínios
espaciais e de tempo fora de regimes dicotómicos e escópicos.
A diferenciação entre arte sonora e música vai além de classificações de
categorias, abarcando disparidades fundamentais na composição de
ambientes sonoros. A arte sonora activa esta multiplicidade de maneiras
que os conceitos tradicionais de música não alcançam, intervindo no
domínio visual e explorando sensações, afectos, tempo e significados que
transgridem práticas de audição predefinidas e representacionais.
É importante traçar a linhagem do som na metafísica ocidental para
compreender estas possibilidades, ligada a uma mudança mais ampla dos
modelos logocêntricos de conhecimento fundados na visão, razão e
abstracção. A arte sonora, em particular, e as artes tempo/espaciais, em
geral, remodelam esta narrativa. Novos campos como "sound studies" e
"Sonic Thinking" testemunham tais transformações, reconfigurando
paradigmas intelectuais.
Nils Meisel (1981) é artista sonoro e sound designer residente no Porto. Doutorando em Arte Contemporânea em Coimbra, fez mestrado em Edimburgo e licenciatura na Universidade Católica. Cofundador das oficinas "Collected Sound Fragments". Trabalha em teatro e cinema experimental. Cofundador da editora Amateur e do coletivo Apocalypse Hotel. Participa em projetos musicais como Preto Marfim, Sereias, Lonzdales's Fantasy, 10.000 Russos entre outros.
Catarina Cota
Os fluxos entre a música popular açoriana e a Canção de Coimbra nos meios de transmissão cultural durante a década de 1960
Partindo da ideia de perspetivas e interceções e servindo-me da
dissertação que estou a desenvolver, pretendo apresentar uma comunicação
sobre Os fluxos entre a música popular açoriana e a Canção de Coimbra,
centrando-se na integração dos estudantes nos planos culturais e na
circulação de canções durante a década de 1960.
“Como circula uma canção?” é a questão central e geral explorada, na
particularidade dos estudantes deslocados dos Açores no meio académico
coimbrão.
A metodologia adotada combina abordagens tradicionais da história com
alguns procedimentos da etnomusicologia. Utilizando assim fontes
primárias, como a revista Plateia e fundos disponíveis na BG/UC sobre
vida académica, espólios de repúblicas de Coimbra e entrevistas
exploratórias.
Esta reflexão tem como base teórica obras como a Enciclopédia de Música
Portuguesa do Século XX, “Notes on deconstructing the popular” de Stuart
Hall e para compreensão do panorama musical português no século XX o
livro de Luís Trindade – Silêncio Aflito – A sociedade portuguesa
através da música popular Dos anos 40 aos anos 70 e Machinas Fallantes
– A música gravada em Portugal no início do Século XX de Leonor Losa. O
contexto histórico é enriquecido por obras como A Canção de Coimbra em
Tempos de Luta Estudantis de Jorge Cravo e “Movimentos estudantis na
crise do Estado Novo: mitos e realidades” de Miguel Cardina.
Catarina da Rocha Cota, licenciada em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e, atualmente, mestranda em História Contemporânea pela mesma instituição onde está a desenvolver a sua dissertação com o tema “Os fluxos entre a Música Tradicional Açoriana e a Canção de Coimbra – Os anos 60 e o Disco Temas Açorianos (Baladas)".
Inês Mariano
A negociação identitária através do Dabke e a autenticidade híbrida no Shamstep dos 47Soul
Esta comunicação visa explorar a evolução dinâmica da tradição
folclórica palestina conhecida como Dabke, debruçando-se sobre o seu
papel enquanto palco histórico e contínuo de projeções identitárias ao
serviço de agendas pan-árabes, esforços coloniais israelitas e enquanto
âncora do sentimento nacional palestino. Ao colocar a tónica sobre o
processo que preconizou o encontro entre esta expressão performática e a
música eletrónica, a presente abordagem visa deslindar narrativas
intricadas de projeção identitária, mediação cultural e de
(re)representação. O caso de estudo, personificado pelo grupo 47soul,
ilustra o vasto campo de negociações e renegociações identitárias em
que, necessariamente, assenta a produção cultural de uma segunda e
terceira geração de refugiados palestinos na pessoa destes jovens
nascidos na cosmopolita cidade de Amã, Jordânia.
Pretende-se avançar uma leitura crítica sobre o modo como o Dabke veio,
historicamente, a mediar, não apenas a causa nacional palestina, mas
também agendas pan-árabes reminiscentes de uma “Grande Síria” (Sham), ou
ainda sendo co-adoptado ao serviço da legitimação do projecto colonial
israelita. Esta proposta enfatiza a evolução contemporânea da expressão
sónica do dabke no sentido da música eletrónica, focando-se no conceito
de “Terceiro Espaço” avançado por Homi K. Bhabha. Neste terceiro espaço,
o Dabke eletrónico, sob títulos como Shamstep e outros, transforma-se em
verdadeiro palco de negociações identitárias múltiplas, envigorado pelas
experiências de uma nova geração de músicos que se vê a braços com a
problemática multifacetada de coexistir enquanto palestinianos
desenraizados num país que os acolhe e, simultaneamente, apelar a uma
audiência internacional.
Sou licenciada em História da Arte pela Universidade de Coimbra e mestranda no Mestrado de Estudos Artísticos oferecido pela mesma instituição. Em 2020 fui bolseira de iniciação à investigação pela FCT, integrando o projecto “Tectos Pintados em Portugal: sécs. XIV-XVI” sob mentoria das Dr.as Joana Antunes e Marta Simões, do qual foi fruto a comunicação do mesmo nome inserida no colóquio Patrimónios (In)Visíveis no qual fui oradora.
Comissão organizadora
Lígia Borges Silva
Nuno Trocado
José Oliveira Martins